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26/09/2017 12h30

Jogo Limpo

Rússia promete "vida nova" em sua política de controle de dopagem

Com atletas e modalidades suspensos em função de esquema de manipulação de resultados de doping, país tenta restabelecer confiabilidade diante da comunidade internacional

A Rússia foi o centro das atenções no segundo e último dia da Conferência das Partes, em Paris. Envolvido em um esquema de manipulação de resultados de exames anti-doping, o país teve a oportunidade de dar suas explicações diante de representantes de centenas de países que participam do evento bianual na França para discutir os desafios à garantia do jogo limpo.

Com seis medalhas olímpicas na esgrima conquistadas entre 1988 e 2004, o ministro do Esporte da Rússia, Pavel Kolobkov, se esforçou para mostrar que há um sentimento de renovação e modernização do setor em seu país.

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Situação da Rússia esteve no centro dos debates na Conferência das Partes, em Paris. Foto: Gustavo Cunha/rededoesporte.gov.br

"Já houve uma série de mudanças importantes. Presidentes de federações envolvidas foram substituídos. Houve investigações internas, algumas delas já geraram condenações dos responsáveis. Estamos reestruturando, com o auxílio de consultores da Wada, um sistema eficaz de luta contra o doping. Estamos atuando na vertente médica, na educação, com as confederações esportivas, numa base legislativa, com disposições penais, no reforço da imagem de atletas", afirmou.

Entre as ações previstas está a mudança do Laboratório de Controle de Dopagem para dentro da Universidade de Moscou. A ideia é que a comunidade acadêmica se aproprie da estrutura, que passará, segundo o ministro, a ter completa independência em suas ações.

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Ministro do Esporte da Rússia, Pavel Kolobkov sustenta que seu país está promovendo mudanças estruturais e conceituais concretas para voltar a merecer a credibilidade internacional. Foto: Divulgação

As sanções à Rússia são resultado de uma investigação independente que resultou no Relatório McLaren. Conduzido com respaldo da Agência Mundial Antidoping (Wada), o estudo constatou fortes indícios de manipulação de amostras de urina de mais de mil atletas russos de 30 modalidades. A Wada chegou a recomendar a suspensão da Rússia dos Jogos Olímpicos Rio 2016. O Comitê Olímpico Internacional deixou a decisão para as confederações internacionais. A Federação Internacional de Atletismo optou por suspender os russos, não só dos Jogos, mas das competições que se seguiram, como o Mundial de Atletismo de 2017. Outras confederações vetaram atletas específicos flagrados no esquema. O Comitê Paralímpico Internacional vetou completamente a participação da equipe russa nos Jogos do Rio. 

Desde então, a Wada se aproximou da Federação Russa, assim como consultores independentes contratados pela Unesco, para iniciar um trabalho de parceria na tentativa de resgatar a confiabilidade dos testes e dos atletas russos.

Segundo Olivier Niglli, diretor geral da Wada, a Rússia tem sido permeável ao papel da entidade na tentativa de ajudar a reerguer um sistema antidoping confiável, mas há desafios a serem superados. "A Rússia precisa aceitar oficialmente os resultados do relatório, o governo russo precisa nos dar acesso às amostras de urina do Laboratório de Moscou e a Wada precisa auditar de forma independente a Agência Antidoping da Rússia (Rusada). No fim deste mês está marcada uma primeira tentativa de auditoria. Esse é um processo complexo e que leva tempo", disse.

"A Rússia precisa aceitar oficialmente os resultados do relatório, precisa nos dar acesso às amostras de urina do Laboratório de Moscou e nos permitir auditar a Agência Antidoping"
Olivier Niglli, diretor geral da Wada

Em outra frente, a Wada pretende fazer uma reanálise de cerca de 250 amostras de urina de atletas russos que competiram nos Jogos Olímpicos de Inverno de Sochi, em 2014, e quer concluir esse processo antes da chegada dos próximos Jogos, agendados para Pyongyang, na Coreia do Sul, no ano que vem. "Casos podem ser reabertos se evidências novas surgirem", afirmou.

Oportunidade na crise

De certa forma, o caso russo promoveu, inclusive, mudanças estruturais dentro da própria Wada. A entidade passou a tratar com mais atenção estratégica a necessidade de investir em investigações independentes, criou programas internos de discussão de novas abordagens, ampliou o foco em pesquisa científica e está desenvolvendo um programa de "delações" para incentivar que atletas, técnicos e pessoas que tenham conhecimento de esquemas ilegais se sintam mais à vontade para denunciar irregularidades. "Grandes turbulências moldam nosso foco em prioridades-chave", resumiu Niggli.

A necessidade de tomar a questão do doping na russa de forma mais ampla apareceu, também, nas recomendações de consultores internacionais contratados pela Unesco. Jean-François Vilotte e Theresa Zabell estiveram na Rússia, conversaram com autoridades e profissionais especializados no setor de controle de dopagem. Disseram ter ouvido das autoridades o compromisso de melhorar todos os aspectos técnicos para tentar se encaixar nos preceitos da Wada e da Conferência das Partes. Ouviram que haveria investimentos em educação, modernização de equipamentos, na base legal. Discurso bem similar ao do ministro do Esporte russo no início deste texto. "Aparentemente são passos importantes na direção certa. E a governança adequada do setor de controle de dopagem é uma demanda que vale não só para a Rússia, mas para vários países. É importante não criar uma estigmatização", afirmou Jean-François.

Estigmatização contra a qual milita o ministro russo. "Queremos conservar os laços com o mundo esportivo internacional. Fui atleta profissional por 17 anos. Conquistei cinco medalhas olímpicas. Sei da importância do esporte. Temos uma responsabilidade coletiva. A Federação Russa está aberta ao diálogo franco, até porque esses problemas ocorrem em outros países. Queremos ajudar os outros", concluiu Pavel Kolobkov. 

Gustavo Cunha, rededoesporte.gov.br