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Judô

13/09/2018 17h00

Baku 2018

O batismo de fogo de Yuko Fujii no Mundial de Judô do Azerbaijão

Primeira mulher a comandar a seleção brasileira masculina na história, a japonesa se mostra confiante e diz que todos estão preparados para conquistar medalhas em Baku

A seleção brasileira masculina de judô que defenderá o país no Mundial sênior de Baku a partir do próximo dia 20 não terá como novidade somente os judocas Daniel Cargnin (66kg), Rafael Macedo (90kg), estreantes na competição individual, e David Lima (73kg), convocado apenas para o torneio por equipe. Do lado de fora do tatame em todas as lutas do time no Azerbaijão estará uma simpática e determinada jovem técnica japonesa chamada Yuko Fujii.

Aos 36 anos, nascida na cidade de Toyoake, na província de Aichi, Yuko é a primeira mulher a ocupar o cargo de técnica principal da seleção brasileira masculina de judô em toda a história da modalidade no país. Desde 1971, ano da primeira medalha do Brasil no Mundial sênior, até 2017, 24 dos 44 pódios conquistados na competição vieram com o time masculino.

Yuko Fujii: no Brasil desde 2013, ela acumulou experiência no time nacional e conhece bem os atletas que comandará no Mundial de Baku. Foto: Abelardo Mendes Jr./rededoesporte.gov.br
"Já conheço todos os atletas e eles me conhecem. Estou acostumada com esse trabalho e eles também com o meu"
Yuko Fujii

A responsabilidade não a incomoda. Pelo contrário. Anunciada como a nova técnica do time nacional no fim de maio, Yuko está a vontade na função.

"Cheguei ao Brasil em 2013 e comecei a trabalhar com todas as categorias: juvenil, júnior, sênior, principal, equipe olímpica, masculina e feminina, e ganhei bastante experiência", recorda. "Agora, virei técnica da seleção masculina e já conheço todos os atletas e eles me conhecem. Estou acostumada com esse trabalho e eles também com o meu", ressalta.

Dono de duas medalhas olímpicas (bronze no Rio 2016 e em Londres 2012) e três pódios em Mundiais (prata em 2013 e bronze em 2014 e 2017), Rafael Silva, o Baby, da categoria pesado (+100kg), confirma as palavas de Yuko.

"No começo, teve que ter uma adaptação, é claro. Mas a gente já tinha ela no grupo, com ela contribuindo, ajudando, e então essa transição foi bastante tranquila. Ela já pegou o jeito, a gente está indo muito bem, e com certeza é uma técnica que vai contribuir bastante pensando nesse ciclo olímpico", elogia Baby.

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No país, é difícil encontrar uma mulher no comando de uma equipe masculina, independentemente da modalidade. O número é ainda menor no esporte de alto rendimento. Assim como Ana Ramkrapes, primeira mulher a treinar a seleção brasileira de Brasil Rugby em cadeira de rodas, Yuko é uma raridade. Mas fala sobre isso com naturalidade e não teme o desafio.

"Acho que é tudo um pensamento das pessoas. Eu nunca pensei que eu iria ser a técnica principal da seleção masculina. Mas hoje estamos em um período de mudança. O pensamento das pessoas está mudando", acredita a treinadora.

"Aqui no Brasil, a primeira campeã olímpica foi Sarah Menezes (em Londres 2012). Depois tivemos a Rafaela Silva (ouro no Rio 2016 e campeã mundial em 2013, também no Rio), a Mayra Aguiar (bicampeã mundial e dona de dois bronzes olímpicos), que estão fazendo sucesso em suas carreiras. Essas coisas vão mudar o pensamento das pessoas. Esse movimento vai crescendo mais ainda. Eu não digo que a mulher é melhor. A gente tem que saber como trabalhar junto para contribuir com o ponto forte que cada um tem. Isso é o que eu acho que é uma coisa importante e esse é o pensamento que eu sempre tenho: 'Como eu posso contribuir para a seleção? Como eu posso contribuir para melhorar as coisas?'"

Assista à entrevista com Yuko Fujii

A meta é o pódio

Yuko foi atleta da seleção nacional júnior do Japão entre 1997 e 2000. Mestre em educação física pela Universidade de Hiroshima, ganhou experiência como treinadora e, entre 2007 e 2009, comandou o judô no Team Bath, da Universidade de Bath, na Inglaterra.

A japonesa também esteve à frente do British Judo Performance Institute, entre 2010 a 2012 e, durante os Jogos Olímpicos de Londres 2012, atuou como treinadora da Equipe Nacional da Grã-Bretanha. O time londrino conquistou dois pódios em casa: prata com a meio-pesado (78kg) Gemma Gibbons e bronze com Karina Bryant, na categoria pesado (+78kg).

"Ela já pegou o jeito, a gente está indo muito bem, e com certeza é uma técnica que vai contribuir bastante pensando nesse ciclo olímpico"
Rafael Silva
Judoca da seleção brasileira

Em seu primeiro Mundial à frente da equipe masculina nacional, Yuko mostra confiança e acredita que, devido a um eficiente programa de preparação, as chances de medalhas são grandes.

"Para preparar os atletas para o Mundial a gente está trabalhando com uma equipe: eu, pessoas da CBJ (Confederação Brasileira de Judô) e do Comitê Olímpico, para fazer o melhor para os atletas", diz. "A gente fez um treinamento de campo no Japão por duas semanas, fizemos treinamento de campo na Espanha por uma semana, e todos treinaram muito bem. Treinamos forte", continua.

Na última fase de trabalhos antes do embarque para a Europa, realizada em Pindamonhangaba (SP), no início de setembro, Yuko fez uma preparação mais individualizada com os atletas. "Acredito que eles vão se sair bem no dia da competição".

Português "na marra"

Yuko é articulada quando fala com jornalistas. Conversa com todos em português e não encontra muitas dificuldades para responder qualquer pergunta. O início, contudo, foi complicado. "Foi difícil. Mas aprendi na marra. Aprendi no tatame", diverte-se.

"É engraçado, porque no início eu tinha um tradutor. Eu falava em inglês e ele falava em português. Mas, uma semana depois, ele começou a não me acompanhar. Então, eu tive que aprender na marra. Os atletas me ensinavam. Quando eu falava a palavra ruim ou que não era correta, eles davam risada. Foi assim que eu aprendi", detalha.

Yuko, com Luiz Shinohara, coordenador da Confederação Brasileira de Judô. Foto: Abelardo Mendes Jr./rededoesporte.gov.br

Por outro lado, a adaptação ao Brasil foi suave. "Eu já me acostumei com a diferença cultural. Na Inglaterra eu sofri mais. Era a primeira vez que eu saía do Japão, não sabia me comunicar com os atletas, e lá, na marra, eu aprendi bastante", recorda.

"Quando cheguei aqui, todo mundo me recebeu bem. É fácil fazer amizade. Então, eu não senti muita dificuldade quando cheguei ao Brasil. Eu senti um desafio, porque aqui no Brasil o judô é grande"
Yuko Fujii

"Quando cheguei aqui, todo mundo me recebeu bem. É fácil fazer amizade. Então, eu não senti muita dificuldade quando cheguei ao Brasil. Eu senti um desafio, porque aqui no Brasil o judô é grande. Na Inglaterra não tinha dinheiro. Não era uma modalidade favorita. Aqui, todo mundo está olhando, todo mundo está cobrando, e eu pensei bastante sobre como eu posso ajudar os atletas, como eu posso ajudar o judô brasileiro".

Além da tradicional hospitalidade brasileira, outro fator ajudou, principalmente no trabalho nos tatames: a ligação entre os dois países em torno da modalidade.

"São 110 anos", pondera. "Muitos japoneses chegaram ao Brasil e começaram o judô, principalmente em São Paulo. O judô no Brasil, mais em São Paulo, é bem parecido com o judô japonês. A essência é bem japonesa. Para mim, não tenho muita dificuldade para conversar com os atletas, com os professores. É bem a linha do judô japonês e isso me ajudou bastante".

Competitividade dos atletas

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Foto: Abelardo Mendes Jr./rededoesporte.gov.br

Para Yuko, apesar das semelhanças em torno da filosofia do judô aplicado no Japão e no Brasil, há um ponto que diferencia bastante os praticantes da modalidade nos dois países.

"No Japão, o judô é um pouco mais uma ferramenta de educação. Então, mesmo não tendo resultado, não importa. Você vai todo dia e treina", esclarece. "No Brasil, eles tentam ganhar na competição, querem ganhar, estão bem focados não só no resultado, mas para melhorar para chegar bem na competição. Esse é o objetivo maior dos atletas", analisa.

"Não estou dizendo que um é ruim e outro é bom. Mas essa é a diferença. Como eu estou trabalhando como técnica de uma seleção que cobra resultado, isso é uma coisa boa. Eu faço ajustes no judô deles e então encaixa bem o que eu faço e o que eles têm", prossegue a treinadora.

É com essa personalidade observadora e com a bagagem acumulada no Japão, na Inglaterra e no Brasil que Yuko Fujii espera ajudar o país a brilhar no Azerbaijão.

Durante os treinamentos no interior de São Paulo, Yuko foi indagada sobre o que a deixaria orgulhosa neste Mundial. A resposta deixou claro suas expectativas: "Uma performance ótima e que todas as categorias ganhem medalha. Nós estamos trabalhando para isso. Eu não estou preparando os atletas só para entrarem na competição. Eu estou os preparando para entrar na luta e para jogar o adversário (no chão). Esse é o nosso trabalho. Se eles realizarem essa performance eu ficaria feliz".

Mais do que prepará-los para o Mundial, o trabalho visa deixar os atletas brasileiros prontos para o principal meta deste ciclo: os Jogos Olímpicos de Tóquio 2020. Aqui cabe uma observação: quando voltar para casa daqui a dois anos, Yuko terá uma missão estranha para uma japonesa que vê seu país sediar o maior evento esportivo do mundo. Se tudo der certo, ela pretende impedir que os anfitriões conquistem ouro no maior número de categorias do judô e, assim, vejam o caminho facilitado para chegar às 30 medalhas douradas que almejam faturar na competição.

Há rivalidade? Alguma animosidade por conta disso?

"Na verdade, eles estão felizes pelo fato de que eu estou aqui como técnica principal da seleção brasileira", explica Yuko. "O Head coach, que é o técnico principal do Japão, me disse: 'Eu aceito o seu desafio'. Ele disse que eu tenho que fazer esse desafio 100%. A relação com eles é ótima e eu estou fazendo o máximo possível para nossos atletas irem bem no dia da Olimpíada", encerra a treinadora.

Comissão Técnica do Brasil no Mundial de Baku

Ney Wilson Pereira - gestor de Alto Rendimento
Seleção Masculina
Luiz Shinohara - Coordenador
Yuko Fujii - Técnica
Seleção Feminina
Rosicleia Campos - Coordenadora
Mario Tsutsui - Técnico

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Retrospecto do Brasil no Campeonato Mundial Sênior

» 7 Ouros
» 12 Pratas
» 25 Bronzes
» Total: 44 medalhas

Retrospecto do Brasil no Campeonato Mundial por Equipes Mistas

» 1 Prata - 2017, em Budapeste - Hungria

Todos os medalhistas do Brasil no Mundial Sênior

1971 (Ludwigshafen/GER)
Chiaki Ishii (-93kg/bronze)

1979 (Paris/FRA)
Walter Carmona (-86kg/bronze)

1987 (Essen /GER)
Aurélio Miguel (-95kg/bronze)

1993 (Hamilton/CAN)
Aurélio Miguel (-95kg/prata)
Rogério Sampaio (leve/bronze)

1995 (Tóquio/JPN)
Danielle Zangrando (-56kg/bronze)

1997 (Paris/FRA)
Aurélio Miguel (-95kg/prata)
Edinanci Silva (-72kg/bronze)
Fúlvio Myata (-60kg/bronze)

1999 (Birmingham/GBR)
Sebastian Pereira (-73kg/bronze)

2003 (Osaka/JPN)
Mario Sabino (-100kg/bronze)
Edinanci Silva (-78kg/bronze)
Carlos Honorato (-90kg/bronze)

2005 (Cairo/EGY)
João Derly (-66kg/ouro)
Luciano Corrêa (-100kg/bronze)

2007 (Rio de Janeiro/BRA)
João Derly (-66kg/ouro)
Tiago Camilo (-81kg/ouro)
Luciano Correa (-100kg/ouro)
João Gabriel Schilittler (+100kg/bronze)

2010 (Tóquio/JPN)
Mayra Aguiar (-78kg/prata)
Leandro Guilheiro (-81kg/prata)
Leandro Cunha (-66kg/prata)
Sarah Menezes (-48kg/bronze)

2011 (Paris/FRA)
Leandro Cunha (-66kg/prata)
Rafaela Silva (57kg/prata)
Sarah Menezes (-48kg/bronze)
Leandro Guilheiro (-81kg/bronze)
Mayra Aguiar (-78kg/bronze)

2013 (Rio de Janeiro/BRA)
Rafaela Silva (-57kg/ouro)
Érika Miranda (-52kg/prata)
Maria Suelen Altheman (+78kg/prata)
Rafael Silva (+100kg/prata)
Sarah Menezes (-48kg/bronze)
Mayra Aguiar (-78kg/bronze)

2014 (Chelyabinsk/RUS)
Mayra Aguiar (-78kg/ouro)
Maria Suelen Altheman (+78kg/prata)
Erika Miranda (-52kg/bronze)
Rafael Silva (+100kg/bronze)

2015 (Astana/CAZ)
Érika Miranda (-52kg/bronze)
Victor Penalber (-81kg/bronze)

2017 (Budapeste/HUN)
Érika Miranda (-52kg/bronze)
Mayra Aguiar (-78kg/ouro)
David Moura (+100kg/prata)
Rafael Silva (+100kg/bronze)

Luiz Roberto Magalhães - rededoesporte.gov.br