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Tenis de mesa

03/05/2017 21h19

Legado Esportivo

"Herança" da Rio 2016 é responsável por 60% do Brazil Open de Tênis de Mesa

Todas as mesas e o piso do torneio em São Paulo são os mesmos usados nos Jogos Olímpicos e Paralímpicos. Material da modalidade já ajudou a equipar seis centros regionais

Houve um tempo em que ganhar ou perder não fazia tanta diferença prática para Hugo Calderano. O atual número 22 do ranking mundial lembra bem da época em que iniciava no tênis de mesa, no Fluminense, e só havia duas mesas para treino. Em volta delas, num piso longe de ser o ideal, era comum se juntarem duas dezenas de atletas. "O Rio não era, há até bem pouco tempo, um estado muito forte no tênis de mesa. Então era comum juntarmos uns 20 para usar duas mesas. Aí você tinha de jogar uma ou duas vezes e sair para dar lugar aos outros", recorda.

Acima, qualifying e chave sub-21 do Brazil Open em mesas e piso da Rio 2016. Abaixo, seleção brasileira na área de treino do CT Paralímpico, equipada com materiais usados nos megaeventos. Fotos: Gustavo Cunha/ME

Curiosamente, é uma herança do Rio, ou dos Jogos Olímpicos, que tem ajudado a mudar um pouco a percepção de atletas e dirigentes país afora. Desde o fim dos megaeventos, as mesas que coroaram a hegemonia chinesa no cenário mundial já ajudaram a equipar seis centros regionais de treinamento, além de terem composto, ao lado de pisos, aparadores (que delimitam a área de jogo) e bolinhas, o "acervo" do CT Paralímpico, em São Paulo. A estrutura paulista recebe, até domingo, o Brazil Open de tênis de mesa olímpico.

"Todas as mesas daqui e o piso vieram das Olimpíadas. O resto é específico desta competição, que a gente traz e adapta"
Edmilson Pinheiro, gerente de eventos da Confederação Brasileira de Tênis de Mesa

"É a segunda vez que venho ao Brasil depois da Olimpíada e ver este CT me deixa feliz. Os paralímpicos estão com uma estrutura de alto nível e espero que consigam aproveitar bem. Não é para qualquer um. Fico feliz de ver que a gente evoluiu, não só nos resultados, mas que estamos tirando proveito da evolução técnica com essa infraestrutura", disse Calderano.

Confiante para o Brazil Open após conquistar o Aberto do Chile no último fim de semana, Caroline Kumahara enfatiza o caráter múltiplo do CT de São Paulo. "Além de ser uma boa estrutura para os paralímpicos treinarem, é ótimo para fazermos seletivas nacionais olímpicas, como já fizemos, além de torneios regionais e agora o Aberto do Brasil", afirmou uma das representantes do país nos Jogos do Rio.

"São poucos os ginásios com estrutura para o tênis de mesa, que exige uma porção de detalhes. Nem sempre uma quadra em que se joga futebol dá para o tênis de mesa, porque há lugares que entra vento e um pouquinho que seja já atrapalha. Um pontinho de luz, dependendo do lugar, incomoda bastante", exemplificou Kumahara. No CT de São Paulo, durante o Brazil Open, a área de treinos fica no espaço oficial dos atletas paralímpicos e a área de jogo foi montada no ginásio do goalball, que é climatizado e com iluminação apropriada.

Técnico da seleção brasileira masculina, Lincon Yasuda ressalta que um dos diferenciais do CT de São Paulo é evitar grandes empreitadas logísticas. "A gente tem uma dificuldade histórica em ter lugares próprios para traçar uma estratégia de preparação e realização de eventos, além de seletivas para formação de equipes. Aqui a gente reúne tudo de altíssimo nível, de primeiro mundo. O local está aqui, o piso está aqui, as mesas estão aqui. Não há necessidade de logística de transporte, de desmontar num canto e montar no outro. É um espaço moderno, climatizado. Contribui para trabalharmos num nível alto".

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Bruna Takahashi durante o Brazil Open. Atleta integrou a seleção olímpica nos Jogos do Rio. Foto: Christian Martinez/CBTM

Adaptação mais simples

Segundo o gerente de eventos da Confederação Brasileira de Tênis de Mesa, Edmilson Pinheiro, 60% do material utilizado no Brazil Open tem como origem os Jogos do Rio. "Todas as mesas daqui e o piso vieram das Olimpíadas. O resto é específico desta competição, que a gente traz e adapta", disse.

"Além de ser uma boa estrutura para os paralímpicos treinarem, o CT é ótimo para fazermos seletivas nacionais olímpicas, como já fizemos, além de torneios regionais e agora o Aberto do Brasil"
Caroline Kumahara, atleta da seleção olímpica

Técnico da seleção feminina e dono de dez ouros em Jogos Pan-Americanos, Hugo Hoyama enxerga, também, um ganho imaterial no uso do "espólio" olímpico. "Dependendo de como o atleta encara, jogar numa mesa onde foi disputada uma Olimpíada é um estímulo a mais. Você se sente valorizado, importante. Temos de aproveitar isso ao máximo", afirmou.

Em âmbito continental, o conceito de aproveitar o material dos Jogos para equipar as novas gerações já é visto até como inspiração. Segundo José Luis Urrutia, técnico da seleção chilena, o padrão é o mesmo que está sendo pensado pelos chilenos, que pleiteiam sediar os Jogos Pan-Americanos de 2023, em Santiago. "No Chile, estamos com esse pensamento, de criar uma infraestrutura adequada e ajudar a melhorar o nível do esporte", afirmou Urrutia.

Ampliar a base de atletas é o desafio

Porto Alegre (RS), Rio de Janeiro, Varginha (MG), Teresina (PI), São Bento (SC) e Cuiabá (MT) já receberam mesas, aparadores, bolinhas e pisos dos Jogos Olímpicos. Manaus (AM), Belém (PA), Aracaju (SE) e Juazeiro do Norte (CE) são as próximas na fila, segundo informações da Confederação Brasileira de Tênis de Mesa. A exigência para que os estados recebam os materiais é que as federações esportivas tenham um local físico apropriado e um projeto de formação de talentos.

"Normalmente é o seguinte: a federação estadual entra em contato com a CBTM. Temos um projeto de montar centros de treinamentos estaduais. As cidades que têm estrutura para receber os centros nos procuram e fazemos a parceria. Tem de ser assim. Não dá para doar mesas sem que haja a certeza de um uso compatível. A confederação cuida da logística. Temos todos os equipamentos num depósito e vamos distribuindo de acordo com as parcerias", explicou Edmilson Pinheiro.

Teresina (PI), Cuiabá (MT), Rio de Janeiro (RJ) e São Bento (SC). Centros regionais com estrutura olímpica. Fotos: Divulgação

"A ida de mesas e estruturas para outras cidades ajuda a aumentar a quantidade de praticantes. Esse é um problema da base do tênis de mesa e de esportes não muito populares no Brasil", comentou Caroline Kumahara. "Não temos muitos lugares para começar, mesmo que seja para brincar. E é na brincadeira que você encontra uma criança ou adolescente com talento e que antes não achávamos porque não havia espaço. Com essa criação de centros regionais damos mais opções", completou.

"É comum que uma criança de sete, oito anos, tenha contato com a modalidade pela primeira vez num centro regional. E se isso ocorre em mesas de qualidade, usadas numa Olimpíada, a capacidade de a gente gerar deslumbramento e motivação é muito maior"
Lincon Yasuda, técnico da seleção brasileira

Para Lincon Yasuda, a estrutura adequada ajuda, inclusive, a encantar os atletas num primeiro contato. "A gente tem de lembrar que o tênis de mesa é uma modalidade que não está todos os dias na televisão, não tem visibilidade intensa. É comum que uma criança de sete, oito anos, tenha contato com a modalidade pela primeira vez num centro regional. E se isso ocorre em mesas de qualidade, usadas numa Olimpíada, a capacidade de a gente gerar deslumbramento e motivação é muito maior", opinou. "Com isso, ampliamos a chance de o atleta querer continuar. Esse tipo de ambiente ajuda a criança a 'respirar' com uma mentalidade mais alta", disse.

Herdeiros de outras modalidades

A chave principal do Brazil Open, com os atletas da seleção brasileira e os estrangeiros melhor ranqueados, será disputada a partir de sexta-feira, com as finais no domingo. Os dois primeiros dias são dedicados ao qualifying da chave principal e ao torneio Sub-21 masculino e feminino. Mas, se o tênis de mesa é o foco das atenções momentânea, a herança olímpica e paralímpica é visível no CT de São Paulo em várias modalidades.

Segundo informações do Comitê Paralímpico Brasileiro, a lista de equipamentos que passaram a compor o cardápio do dia a dia dos atletas paralímpicos inclui todo o material de halterofilismo, plataformas de lançamento do atletismo, bandas laterais do futebol de cinco (para deficientes visuais), bancos de reservas, mesas de controle e bolas do futebol de sete, material de bocha, bolas, postes, redes e raquetes de tênis em cadeira de rodas, móveis da área vip, mesas da área de imprensa e dos escritórios do comitê organizador, além de balanças, edredons, travesseiros e dois bebedouros.

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Material do halterofilismo e traves do goalball usadas na Rio 2016 no CT Paralímpico de São Paulo. Fotos: MPix/CPB

Estrutura

O Centro de Treinamento Paralímpico fica no Parque Estadual das Fontes do Ipiranga e é um dos pontos principais da Rede Nacional de Treinamento constituída pelo Governo Federal. Construída seguindo parâmetros de acessibilidade, com rampas de acesso e elevadores, a estrutura conta com 86 alojamentos, capazes de receber entre 280 e 300 pessoas, e áreas para o treinamento de 15 modalidades paralímpicas: atletismo, basquete em cadeira de rodas, bocha, natação, esgrima em cadeira de rodas, futebol de 5, futebol de 7, goalball, halterofilismo, judô, rúgbi em cadeira de rodas, tênis de mesa, tênis em cadeira de rodas, triatlo e vôlei sentado.

A unidade está dividida em 11 setores, que englobam áreas esportivas de treinamento, hotel, centro de convenções, laboratórios, condicionamento físico e fisioterapia. O empreendimento recebeu investimento de R$ 305 milhões, sendo R$ 187 milhões em recursos federais. Do total do aporte do Ministério do Esporte, R$ 167 milhões foram investidos na construção e outros R$ 20 milhões em equipagem.

De São Paulo, Gustavo Cunha, brasil2016.gov.br