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Atletismo

09/06/2017 17h13

Atletismo

Da "era do carvão" ao status de referência continental, Arena Caixa se consolida como legado da Rio 2016

Estrutura em São Bernardo (SP) atende centenas de atletas da base ao alto rendimento, é aberta à população para prática de caminhadas e se tornou polo dos principais eventos da modalidade no país

Kássia Pires, ainda que muito jovem, é remanescente da "era do carvão" em São Bernardo (SP). Treinou na pista de atletismo do então clube da Volks nos tempos em que o piso era composto pelo mineral batido. Triplista na escolinha da Arena Caixa, ela é retrato da pequena revolução que a infraestrutura esportiva de referência no atletismo representou para a cidade e para a modalidade desde que foi inaugurada, em março de 2014.

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Kássia Pires: 'cestinha' no Troféu Brasil, aluna da escolinha e sonho de ser triplista numa Olimpíada. Foto: Gustavo Cunha/Brasil2016.gov.br

A atleta de 16 anos é aluna do grupo de elite da escolinha. Treina gratuitamente cinco vezes por semana no espaço de 30 mil metros quadrados. Ela, outras 250 crianças e adolescentes e mais 44 atletas de alto rendimento se beneficiam diretamente do investimento de R$ 32,5 milhões divididos entre Governo Federal e prefeitura da cidade para modernizar o equipamento, que tem pista com Certificação 1 da Federação Internacional (IAAF), a mais alta. 

"Correr no carvão e numa pista assim não dá nem para comparar. Mudou tudo. Eu evoluí demais"
Kássia Pires

No Troféu Brasil, que teve início nesta sexta-feira (9.06) e reúne os 600 melhores atletas do país, Kássia é "cestinha", nome que indica as pessoas responsáveis por carregar mochilas, tênis e camisetas dos competidores. Mas, diante da vitrine de luxo que se tornou a arena, que recebe as principais competições do calendário nacional, sonha com a mudança de papéis.

"Estar aqui ao lado deles me faz querer um dia estar numa Olimpíada ou, pelo menos, num Troféu Brasil como atleta", disse a adolescente, que participa de várias provas de sua categoria. "Correr no carvão e numa pista assim não dá nem para comparar. Mudou tudo. Eu evoluí demais", contou a atleta, que lista as mudanças de patamar entre a estrutura antiga e a atual. "Todos os materiais agora são top: dardos, barreiras, o rastelo para passar na areia e deixar ela lisinha para não machucar nosso pé, os colchões do salto em altura e salto com vara". 

Nycolas Iglesias no arremesso de peso do decatlo. Atleta já migrou para o status de espelho dos mais jovens em São Bernardo. Foto: Marcello Zambrana/CBAt

Nycolas já deu o passo adiante

Integrante da equipe de alto rendimento de São Bernardo (Asa), Nycolas Yglesias Nascimento, de 22 anos, já deu o passo sonhado por Kássia e foi promovido do papel de fã para o de espelho. Ele é um dos dez inscritos do decatlo no Troféu Brasil e estará, no domingo, lado ao lado com o ídolo e ouro olímpico Thiago Braz na prova do salto com vara.

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"Treinar e competir aqui é um privilégio. A pista é a melhor da América Latina. A gente se sente bem, em casa. Antes eu treinava em São Paulo. Quando finalizou aqui, viemos para cá e os resultados melhoraram. Progredimos demais. Hoje, a molecada vê a gente treinando, se inspira, conversa com a gente. É um pessoal interessado, das escolas e das comunidades aqui ao lado", explica Nycolas, em referência aos bairros de Irajá, São Pedro, Tanque e Esperança, que circundam o complexo, e à escola municipal que funciona dentro da estrutura. Cerca de 400 alunos, inclusive, ajudaram a encher as arquibancadas do complexo, que é um dos elos estratégicos da Rede Nacional de Treinamento do Ministério do Esporte, para acompanhar as provas deste primeiro dia de Troféu Brasil.

"As minhas melhores marcas saíram aqui. Tem um clima diferente, além da pista de alta qualidade e da arquibancada bem colocada"
Paulo André, campeão dos 100m rasos no Troféu Brasil e no GP Brasil, ambos disputados na Arena Caixa

O sentimento de aconchego de Nycolas é o mesmo do principal representante da nova e talentosa geração de velocistas nacionais. "Esse lugar eu não tenho o que falar. As minhas melhores marcas saíram aqui. Sempre sinto uma coisa diferente. É especial aquecer, entrar, passar por todo o trajeto: tem um clima único, além da pista de alta qualidade e da arquibancada bem colocada", afirmou Paulo André de Oliveira, vencedor da prova dos 100m rasos no Troféu Brasil nesta sexta-feira (9.06) e ouro no GP Brasil, disputado no último fim de semana no mesmo local. 

Múltiplas funções

Segundo Mauro Valdineis Mendes, que trabalha na gestão da arena desde sua inauguração, o espaço tem tido usos variados. "A gente tem categorias de base, com crianças desde os sete anos nas escolinhas, turmas lotadas e lista de espera, e muita gente das comunidades do entorno. Atendemos também o alto rendimento e a população em geral, que usa o espaço de manhã cedinho e no fim da tarde para caminhadas", listou. Entre servidores e professores de educação física, mais de 15 profissionais atuam no trabalho com os atletas.

O GP Brasil, disputado no último fim de semana, é exemplo de evento de porte internacional recebido no local, que também é o palco principal dos torneios da Confederação Brasileira de Atletismo e para competições regionais e estaduais. "Além disso, cedemos o espaço para atletas de outras equipes. O próprio Thiago Braz treinou com a gente num período", afirmou Mauro. "Equipes da Eslovênia e da Argentina ficaram aqui para treinar na fase de aclimatação para os Jogos Olímpicos do Rio", lembrou. A manutenção é garantida com um misto de investimentos da Secretaria de Esportes do Município e patrocínio da Caixa Econômica Federal.  

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Muitos dos atletas das escolinhas vêm das comunidades de baixa renda próximas à Arena Caixa. Foto: Gustavo Cunha/Brasil2016.gov.br

De acordo com Pedro Helder, responsável pela equipe de alto rendimento de São Bernardo, a inauguração da arena representou uma "virada de chave". "Nos últimos três anos, nos consolidamos como a quarta ou quinta melhor equipe do país. Temos subido degrau por degrau, mas sem deixar de enfatizar as categorias de base", afirmou Pedro Helder, que ressalta o caráter inclusivo do projeto. "Aqui podemos trabalhar com todo tipo de criança. Alta, baixa, magra, obesa. Existe uma modalidade do atletismo adequada a cada biotipo. Velocista ou fundista, lançador de peso ou saltador. Tem chance para todos. O atletismo é a base de todos os esportes", disse.

"Ah, se fosse assim no meu tempo..."

Mauro Valdineis, que costumava seguir os passos do recordista Eronilde Araújo nas provas de 400m com barreira na década de 1990, reforça o caráter inclusivo e minucioso do trabalho. "Sempre tentamos envolver as famílias. Apresentamos os pais dos alunos aos técnicos, e na iniciação todo mundo faz de tudo um pouquinho. Vai saltar, vai correr. Conforme vai se desenvolvendo, vai descobrindo o perfil. A prova que tem mais facilidade, mais aptidão, e é direcionado", disse, com uma pontinha de frustração por não ter tido algo similar quando foi atleta.

"Ah, se fosse assim no meu tempo... Nada aqui é parecido com o que precisei experimentar. Não tínhamos pista que atendesse nossas demandas. Sou lotado na secretaria de esportes há 31 anos. Vim para cá porque tenho envolvimento grande com o atletismo. Gosto muito do que faço e é bonito de se ver o efeito positivo de todo o trabalho. O recurso público injetado aqui está sendo muito, muito bem aproveitado". 

Gustavo Cunha, brasil2016.gov.br