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Tiro esportivo

21/04/2016 01h12

Entrevista

Cassio Rippel: "o atirador precisa estar adaptado ao estande para buscar uma medalha"

Principal atleta brasileiro das provas carabina, o atual campeão pan-americano fala sobre treinamentos, o evento-teste da modalidade, o Centro Nacional de Tiro Esportivo, a pressão da torcida e o apoio recebido pelos ministérios do Esporte e da Defesa

Quase um século depois das históricas primeiras medalhas brasileiras em Jogos Olímpicos, o tiro brasileiro volta a ter boas chances de pódio. Após uma conturbada viagem até Antuérpia, em 1920, Afrânio da Costa, Sebastião Wolf, Dario Barbosa, Guilherme Paraense e Fernando Soledade conseguiram ouro, prata e bronze. Em 2016, não há problemas na preparação e nem na viagem, pois o Centro Nacional de Tiro Esportivo, localizado em Deodoro, está a cerca de uma hora de trajeto a partir do Centro ou da Zona Sul do Rio de Janeiro. É lá que os nove brasileiros que representarão o país nos Jogos do Rio disputarão as provas.

O evento-teste da modalidade está sendo realizado em Deodoro. E foi durante a Copa do Mundo de Tiro Esportivo que o brasil2016.gov.br conversou com o paranaense Cassio Rippel, melhor brasileiro do ranking da carabina deitado 50m da Federação Internacional de Tiro Esportivo. Rippel ocupa a 18ª posição, mas é uma prova sem favoritos, com briga tiro a tiro entre os 20 ou 30 melhores do planeta.

Cassio Rippel durante sessões de treinamento na Copa do Mundo de Tiro Esportivo, no Rio de Janeiro. Foto: Miriam Jeske/ brasil2016.gov.br

A vaga olímpica veio com a medalha de ouro nos Jogos Pan-Americanos de Toronto, em 2015. Na ocasião, Rippel bateu o recorde pan-americano (625.9 na fase classificatória e 207.7 na final) e deixou o então líder do ranking mundial em segundo lugar. Em 2013 e 2015, Rippel foi agraciado com o Prêmio Brasil Olímpico, como melhor atleta nacional de tiro. Em etapas da Copa do Mundo, o atirador brasileiro ainda não conquistou medalhas, mas já alcançou a final cinco vezes e tem mantido a constância nas marcas entre 622 e 629, o que sempre o coloca em briga direta por vaga na decisão de qualquer competição.

Acompanhe a entrevista de Cassio Rippel

Construído para o Pan de 2007, o Centro Nacional de Tiro Esportivo passou por reformas para os Jogos Rio 2016. Como você avalia a instalação, já que muitos atletas estão conhecendo o local das disputas olímpicas durante a etapa do Rio da Copa do Mundo?

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Estande de 10m no Centro Nacional de Tiro Esportivo, no Rio de Janeiro. Foto: Miriam Jeske/ brasil2016.gov.br

O estande em sim é muito bom. Já o conheço desde 2007 e tenho atirado frequentemente aqui.
As mudanças que foram feitas melhoraram o que já estava bom. O local é excepcional, de nível mundial. Só tenho a dizer que está no mesmo padrão de qualquer estande olímpico do mundo, como os de Pequim, Londres ou Sydney.

O ar-condicionado do estande de competições de 10m, o alvo híbrido e o novo madeiramento elevam o nível. Esse alvo traz uma perfeição muito grande na avaliação. A apuração do alvo é perfeita.

Do lado dos atletas, como está sendo visto o evento-teste para os Jogos?

A organização do evento é muito boa. O evento-teste serve exatamente para isso, para testar a organização e a instalação. Durante os Jogos Olímpicos, teremos 390 atletas. Desta vez, são quase 700. Fazer um evento-teste deste tamanho, com quase o dobro de atletas que estão sendo esperados para as Olimpíadas, é realmente um desafio. Passando muito bem pela organização deste evento aqui, como estamos passando, significa que estaremos muito bem preparados para as Olimpíadas.

Quais foram as modificações principais no estande de 50m aqui em Deodoro?

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Eliminatórias da carabina deitado 50m Masculino. Foto: Wagner Meier/CBTE

Gostei muito do estande de 50m. A grande modificação que ocorreu ali é no madeiramento. O novo é um pouco mais claro e reflete mais luz. Quando estou fazendo a pontaria, eu tenho mais luz ao redor do meu campo de visão. Antes, o alvo era aberto - o sol batia no alvo. Agora, ele é coberto. Ou seja, antes o alvo era claro e ao redor não era tão claro - o que facilitava a pontaria. Hoje, com o claro ao redor e o alvo um pouco mais escuro, temos uma dificuldade maior para fazer a pontaria. O normal é termos uma luminosidade maior no alvo. Por isso, a adaptação ao estande é muito importante. A partir do momento que você está acostumado a essa luminosidade, é uma boa vantagem.

A partir de agora até a Olimpíada, o ideal é termos muitos treinamentos aqui para justamente termos esta vantagem de estar em casa. Ainda não sabemos se poderemos treinar aqui. Já fizemos uma solicitação, mas não sabemos ainda.

Competir no Brasil trará uma pressão extra para vocês?

Diferente de outros esportes, o fator torcida, que pode gerar adrenalina a mais nos atletas, não ocorre no tiro. O tiro vai muito do treinamento que foi feito e a capacidade de repeti-lo no momento da prova. É óbvio que o local da prova pode influenciar - negativamente ou positivamente. Estar adaptado às condições é primordial para buscar uma medalha.

Treino todo dia em um estande em Campinas. Se a competição for lá, já conheço a luz no dia que está chovendo, no dia que está nublado, no dia que tem sol forte. Sei agir no dia que venta e no dia que não venta.

Aqui, tudo é novo. Temos três meses para fazer esse treinamento e acho que não podemos desperdiçar este tempo. Sei que ainda há pequenas obras para finalizar no hall das finais, mas no estande de 50m, que é o meu caso específico, está tudo pronto.

Além de conhecer melhor o estande, o clima do Rio de Janeiro pode ser uma vantagem?

Estar adaptado ao clima do Rio também pode nos ajudar. Já vi norueguês e suíço desmaiarem por conta do calor em competições pelo mundo. Com a roupa que usamos para atirar e com a temperatura e umidade do Rio de Janeiro, parece que o cara sai de seu habitat natural e começa a atirar em uma sauna. Para os brasileiros, acaba sendo natural. É o inverso do que nós sofremos quando vamos competir na Europa no inverno.

Como foi a sua classificação para os Jogos Rio 2016?

Cassio e Júlio Almeida conquistaram ouro no Pan de Toronto. Foto: CBTE

Esta será minha primeira Olimpíada. Conquistei o ouro nos Jogos Pan-Americanos de Toronto, em 2015, e os primeiros lugares no Pan garantiam a cota "place", ou seja, entram sem precisar de convite [Na ocasião, Cassio bateu o recorde pan-americano, com 625.9 pontos na fase de classificação. O primeiro colocado do ranking à época também participou da disputa]. 

No Rio, vou fazer a prova de carabina deitado, no dia 12 de agosto, e a prova da carabina 3 posições, no dia 14. A minha especialidade é a carabina deitado. Estou entre os 20 do mundo há mais de três anos. E é realmente onde tenho mais chances. Já na carabina 3 posições, como tenho índice, também vou fazer a prova, mas não em um nível tão alto. Dentro da prioridade, não posso dividir abrir muito o tempo de treinamento, pois não é muito grande.

Eu treino seis horas por dia. Se passar a treinar seis, sete ou oito horas para fazer mais de uma modalidade, você pode acabar prejudicando a sua especialidade anterior. Por isso, tenho o foco bem definido: a prova de carabina deitado.

Há um favorito nas suas provas?

A disputa, principalmente na carabina deitado, é muito apertada. Pelos resultados do ciclo olímpico, acredito que pelo menos 15 pessoas chegarão ao Rio em condições técnicas e táticas de disputarem a medalha de ouro. O momento é que vai definir. São pequenos detalhes, como você conseguir, naquele dia, traduzir efetivamente o seu trabalho.

Para termos uma ideia, a regra mudou em 2013 porque muitas pessoas alcançavam o máximo da pontuação, que era 600, ou seja 60 tiros de 10 pontos. O tiro valia 8, 9 ou 10. Não tinha mais como você separar o primeiro do segundo ou os três primeiros. Então, passou-se a utilizar as casas decimais. O tiro 10 perfeito passou a valer 10.9 e, gradativamente, o tiro que somente toca na linha central passou a ser 10.0. Hoje, o resultado máximo da minha prova é 654, não mais 600.

Se em uma competição você consegue fazer apenas um décimo a mais em cada tiro, você terá seis pontos a mais. A prova segue devagarinho para buscarmos o 10.9 a cada momento.

Foto: Miriam Jeske/brasil2016.gov.br

A partir de que ponto houve uma evolução na sua carreira esportiva?

Aqui nessa competição, você vê muitas equipes muito bem montadas. Suíça, Japão, Estados Unidos, Itália... Todos esses têm sua equipe multidisciplinar, com fisioterapeutas aliviando os músculos em macas montadas nos estandes.

Hoje, graças ao Plano Brasil Medalhas e à Bolsa Pódio do Ministério do Esporte, eu posso ter essa equipe multidisciplinar. Tenho apoio para adquirir meu equipamento e material e tenho apoio para minhas viagens. O suporte que estou tendo é muito bom.

Essa diretriz do Ministério do Esporte foi muito feliz. É um suporte fenomenal para os atletas.
Faço votos que tenhamos uma extensão até 2020, para as Olimpíadas de Tóquio. Sem dúvida nenhuma, esse apoio é capaz de fazer com que a gente cumpra o objetivo de figurar no Top 10 do quadro de medalhas. Sem o plano, não seria possível.

A carreira militar também influi no desempenho?

Sou major e meu maior apoiador é o Exército Brasileiro. O convênio entre os ministérios da Defesa e do Esporte é muito frutífero. Para termos uma ideia, no tiro esportivo da bala, os cinco representantes brasileiros nos Jogos Olímpicos Rio 2016 serão militares: eu, Felipe Wu, Emerson Duarte, Rosane Budag e o Bruno Lion Heck ou o Júlio Almeida. Os quatro do tiro ao prato não são militares, pois não é uma modalidade militar.

 

Abelardo Mendes Jr - brasil2016.gov.br